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Patrícia Sucena de Almeida


Foto: Patrícia Sucena de Almeida

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Questionário/ Entrevista

· Descreva as suas raízes familiares, culturais e sonoras/ musicais, destacando um ou vários aspetos essenciais para a definição e a constituição de quem é no tempo presente. ·

Patrícia Sucena de Almeida: Os principais agentes foram e são os meus pais, que sempre, e paralelamente ao ensino geral me incentivaram a contactar com as várias áreas artísticas iniciando num colégio interno diurno onde, para além de aulas regulares normais, frequentava aulas de Piano, Educação Musical, de Conjunto e Ballet. Prossegui no Conservatório de Coimbra com o pianista Jorge Ly, que me incentivou ao estudo não só do instrumento, mas também da Análise Musical e Técnicas de Composição. Posteriormente aprofundei os meus estudos com o pianista Miguel Henriques, em Lisboa, e com o compositor João Pedro Oliveira, em Aveiro, inicialmente com aulas particulares e posteriormente na Universidade, começando a delinear um caminho na Composição.
Destaco a dificuldade em conseguir um ensino da música apropriado por vezes para cada aluno, já que nem sempre se encontravam profissionais competentes, quer a nível musical quer pedagógico, dificultando assim o caminho na arte. Apesar disto, todas as experiências foram e continuam a ser importantes para a formação e crescimento de cada um. O que se é no presente também está em constante mudança, tal como o mundo e as circunstâncias diárias. Temos que adaptar. A tomada de determinadas decisões conduziu às consequências associadas quer positivas quer negativas, tendo sido sempre o ‘lema’, não abdicar da maneira de ser e pensar, mas lutar sempre por manter esta postura e atitude perante a vida. Ser persistente – resistente – sempre com espírito crítico.

· Que caminhos a levaram à composição? ·

PSA: O interesse pela composição, que abarca várias vertentes, desde a orquestração, técnicas de composição, análise, criação livre, surgiu progressivamente, e quase por acaso, tendo sido imprescindíveis alguns professores que me incutiram a necessidade aquando do estudo instrumental/ piano, analisar e pesquisar. Permitia-me uma melhor compreensão dos aspetos estéticos/ estilísticos/ composicionais, contribuindo para uma performance mais interiorizada e decifrada.
A mecânica destas construções (peças) através da harmonia, ritmo e outros parâmetros da composição tonal conduziram-me a apreciar também e mais tarde, os vários estilos do século XX que comecei a explorar por indicação de alguns professores, mas também por incentivo próprio. Considero importante mencionar a importância dos estudos universitários nesta exploração, onde tive acesso a partituras e gravações do repertório do século XX e que ouvia e analisava compulsivamente. A opção por seguir o curso de Composição foi decidido com o conselho de vários professores, tendo prescindido do curso de instrumentista/ pianista e considerado também pessoalmente, possuir capacidades a nível da criação e da técnica/ análise. A partir deste momento, há que mencionar um período inicial de contacto com a música eletroacústica e a composição durante a Licenciatura em Ensino de Música na Universidade de Aveiro. Seguiu-se o desenvolvimento e aprofundamento da vertente de orquestração durante o Mestrado em Composição na Universidade de Edimburgo e o programa de Doutoramento na Universidade de Southampton, com a supervisão do compositor Inglês Michael Finnissy. Considerei sempre essencial, para além de um ensino mais formal, a participação em seminários, aulas, cursos, workshops com agrupamentos, solistas e maestros. Menciono compositores como Emmanuel Nunes, Jonathan Harvey, Luca Francesconi, Hilda Paredes, Gérard Grisey, Brian Ferneyhough, Mauricio Kagel, Pascal Dusapin, Luc Brewaeys; workshops experimentais e concertos com o Arditti Quartet, o pianista Ian Pace, a Orquestra Gulbenkian, L’Ensemble Itinéraire, o Sond’Ar-te Electric Ensemble, o Remix Ensemble, a OrquestrUtópica, e com os maestros Guillaume Bourgogne, Pedro Neves, Pedro Amaral, Pedro Carneiro.

· O seu caminho percorre de acordo com um plano, por exemplo sabe que daqui a ‘x’ anos vai cumprir os objetivos ‘y’? Ou acha a realidade é demasiado caótica para poder criar tais determinações? ·

PSA: O planeamento profissional e a outros níveis seguiu caminhos diferentes. Enveredar na composição foi quase por acaso, como referi anteriormente, e por isso não foi planeado. O que se seguiu começou a ser mais definido já que tomei a decisão de prosseguir o rumo da investigação, finalizando o Pós-Doutoramento em 2013. A partir deste momento não segui o que tinha delineado, devido a vários constrangimentos a nível institucional. O Ensino Universitário teria sido o mais indicado, mas devido a dificuldades várias num país que não coloca os seus investigadores nas instituições de ensino onde estão a desenvolver os seus projetos, levou-me a percorrer ‘montes e vales’ nunca me afastando do ensino da música. Referir estas situações, que foram por vezes de decisão forçada, ajuda a explicar um pouco o processo criativo e a sua ligação com a vida de cada um, que balança entre o caos e a organização, essenciais para o equilíbrio final. O caos é o início, para mim, do processo total, constituído por um turbilhão de impulsos que surgem de várias fontes e que já referi como fontes de impulso inspirador. É um caos diferente do caos exterior da vida. A organização do primeiro caso – mental/ criativo é essencial a certo momento, selecionando o essencial, mesmo que sofrendo alterações, mas tão necessário para a criação de um ‘objeto artístico’. No segundo caso – humano/ mundo, é impossível ambicionar por essa organização. Não possuímos individualmente a capacidade para tal. Assim penso que é essencial diferenciar estes dois tipos de caos. O caos individual poderá não estar em consonância com o caos coletivo. Ainda considero a existência de outro tipo de ‘caos’ – aquele que nos leva a não ter tempo/ espaço mental para a criação e neste caso em consonância com o exterior. O que nos é imposto como ‘vida’ a certa altura, não nos disponibiliza tempo/espaço para ‘estar em sossego’, em ‘silêncio’, e criando, precisando-se de concentração e total dedicação.
Estranho quem tenha a vida planeada. As expetativas não podem existir em demasia.

· No seu entender, o que pode exprimir e/ ou significar um discurso musical? ·

PSA: O discurso musical com ou sem a coexistência de ‘outros discursos’ paralelos, interagindo entre si, é indissociável da pessoa que escreve, da sua vida. Conjugam-se e ‘vivem’ em paralelo formando uma totalidade. Esse discurso modifica-se ao longo de cada percurso, conforme as circunstâncias vivenciais, do ‘estado’ de alerta e não de estagnação, a par de um crescimento interior. É um meio de transmissão/expressão de emoções e pensamentos, mediante a presença no mundo em determinada era, todavia é um discurso/ ‘outros discursos’ que requer um estudo e amadurecimento ao longo do tempo coordenado/os com a reflexão, pesquisa e invenção para que se torne um discurso pessoal. Assim, não podemos colocar este discurso/ ‘outros discursos’ no mesmo patamar das formas diretas do dia-a-dia que são espontâneas. Poderemos utilizá-las (formas diretas) como base para serem exploradas através de um refinamento utilizando um discurso, no meu caso, musical, com ou sem ‘outros discursos’ paralelos.

· Existem fontes extramusicais que de uma maneira significante influenciem o seu trabalho? ·

PSA: Não me sinto alienada das outras áreas artísticas, nomeadamente da pintura, escultura, instalação, fotografia, literatura, filme, dança, teatro, entre outras, mesmo que a vertente explorada numa determinada criação seja puramente instrumental. Não posso deixar de referir igualmente, alguns períodos da música que me continuam a influenciar, como o Barroco, o Romântico e os séculos XX e XXI. Refiro Stravinsky pelas suas estruturas polirrítmicas, desenvolvimento motívico, utilização de formas tradicionais e o serialismo; Schoenberg pelos desenvolvimentos na atonalidade, técnicas dodecafónicas e práticas de combinatorialidade inversa dos hexacordes, as invariâncias, os agregados, as séries derivadas, o Sprechstimme; Lutosławski pela construção de texturas, utilização de pequenos grupos de intervalos, dessincronia rítmica; Penderecki pelo uso das técnicas modernas e não ortodoxas de performance instrumental/ vocal, notação gráfica, texturas de clusters; Ferneyhough pela complexidade rítmica, tendência para sistemas criadores de material e delimitadores formais, notação complexa; Kagel pelo envolvimento com o teatro instrumental; Stockhausen pela música eletrónica, espacialização e música cénica. Há sempre convergências históricas, estéticas, estilísticas, etc., entre as várias áreas, e daí o meu interesse na sua exploração. Não as considero unicamente como fontes, influências, mas podem ser elementos fundamentais numa criação, estar presentes, interagindo entre si. Assim, poderemos encontrar nas notas introdutórias de cada criação, referências/indicações sobre performance teatral, cenografia, coreografia, imagem, fotografia, texto, e outras.

· No que diz respeito à sua prática criativa, desenvolve a sua música a partir de uma ideia-embrião ou depois de ter elaborado uma forma global? Por outras palavras, parte da micro para a macro forma ou vice-versa? Como decorre este processo? ·

PSA: Há que definir várias fases no processo criativo. Numa primeira fase (já com uma ideia ou não definida), inicia-se um trabalho que pode abranger não só pesquisas na área da música, mas também no mundo da arte em geral. Designo-as como fontes de impulso inspirador. Estas fontes podem tornar-se elementos essenciais impulsionadores de ideias e do seu desenvolvimento ou estar presentes como interventivas, interagindo com a música e vice-versa, caraterizando a obra como interativa disciplinar. Numa segunda fase, aplica-se um processo que envolve a relação com o título, para a delimitação dos planos sonoro, rítmico e formal. Os títulos são escritos em latim, já que se pretende ir à raiz da língua portuguesa e encontrar o significado exato pretendido. Surge uma ligação entre as letras dos títulos e o material sonoro, delimitado para cada criação, com métodos específicos, que implicam regras criadas, que transformam as palavras latinas num código musical (o interesse por códigos, cifras, verificou-se em compositores como Johann Sebastian Bach, Robert Schumann, Maurice Ravel, Alban Berg, etc.). Podem-se relacionar os métodos utilizados de desenvolvimento do material em termos melódicos com as práticas seriais, todavia não remetendo para o serialismo integral, mas associado à existência de uma escala com um certo número de notas e intervalos relacionados, gerados através do processo referido anteriormente (letras do título) e com a transposição cromática. Quanto aos processos rítmicos, estes implicam transformações de diminuição e aumentação de valores e uma utilização de acordo com a forma e desenrolar da ‘narrativa’, mas também a transposição direta de ideias para gestos, tendo como base ideias visuais, sonoras, etc. No plano formal, é concebida uma predelineação, com pontos fulcrais, climáticos (chegada) e resolução, e cujo esquema inicial pode sofrer, como é natural, alterações durante o processo de composição. Defino uma forma geral por secções/ partes – macro forma, e subsecções que dividem ainda a estrutura geral e que estão relacionadas com as várias fases de desenvolvimento da ‘narrativa’, mas que poderão funcionar como ‘guião’ não só para quem ‘escreve’, mas também para quem ‘lê’. Não pretendo com isto uma interpretação fechada, mas que também não dará margem para uma fuga ‘desenfreada’. Pretendo uma rigorosa interpretação e nesse sentido o detalhe na escrita nos seus vários níveis, que se completam com as notas de performance associadas.
Numa terceira fase, inicia-se o processo de escrita, bastante moroso e que implica a escrita que quando terminada, e numa última fase, quarta, será revista e finalizada com tudo o que pretendo.
Refiro que podem coexistir vários elementos, interagindo entre si, e que caraterizam o trabalho como interativo disciplinar, sendo necessário também um guião de performance, que acompanha a criação e que se vai construindo igualmente para que todos os elementos funcionem como um todo – o cenário, a luz, a ação, e outros.

· Como na sua prática musical determina a relação entre o raciocínio e os impulsos criativos ou a inspiração? ·

PSA: Ao que se chama inspiração, não surge sem ativar o nosso interior, implicando sempre pesquisa, trabalho, e estar atenta. Cada um tem as suas fontes de impulso inspirador provenientes das outras áreas artísticas ou não ou até de situações da vida, do nosso dia-a-dia, do mundo. Não nos podemos sentar e esperar que a inspiração nos bata à porta. É claro que ela existe e impulsiona todo o tipo de atividade do Ser Humano. Mas é preciso investir o nosso tempo para definitivamente e de forma também mais racional iniciarmos o processo criativo que como referi anteriormente, tem para mim diversas fases. Após a ‘recolha’ e seleção das fontes de impulso inspirador é necessário ativar o mundo racional para organizar os vários níveis de funcionamento de uma nova criação. A inspiração é também para mim a ‘força’ que nos leva a seguir o caminho em cada criação, sem o abandonar, e de o mudar se for necessário perante o que pretendemos como resultado.

· Em que medida, os novos instrumentos eletrónicos e digitais abrem para si novos caminhos e quando os mesmos se tornam constrangedores? ·

PSA: Apesar de ter estudado música eletroacústica, não foi um caminho que me interessou seguir e neste momento mantenho a mesma postura. Continuo a preservar a interação entre instrumentista/ compositor como explorador(es) ou com outros intervenientes, conforme o projeto.
A possível utilização de outras sonoridades sem ser instrumentais nunca estão descartadas, nomeadamente a gravação de som, talvez a sua manipulação, mas deixando ‘soar’ como é, sem a sua transformação completa. O mundo eletroacústico ainda não me surpreendeu, sentindo uma ‘cópia’ de obra para obra sem uma originalidade daquele que utiliza estes meios. Não sinto que essa ferramenta sonora seja explorada, mas incluída como ‘remédeio’. O tipo de escrita de cada um também poderá influenciar ou não a abertura destes caminhos tal como as influências que tivemos no nosso percurso. Não considero constrangedores. O resultado de qualquer criação pode ser constrangedor. Ainda neste século a utilização das extended techniques ainda é constrangedor. O envolvimento dos instrumentistas em ações que implicam ser um ‘ator’ e ter outras funções ainda é constrangedor. Ir a um concerto com repertório destes dois séculos é constrangedor. Tudo isto não na minha perspetiva, como é óbvio, mas do mundo de hoje (ainda).

· A pesquisa, a experimentação e a invenção, constituem para si elementos indissociáveis da criação musical e, em geral, da Arte? ·

PSA: As situações referidas são, não só indissociáveis como imprescindíveis. A pesquisa contínua a vários níveis, quer musical quer a nível artístico geral, tal como estar atento ao mundo que nos rodeia, as suas mutações, é o que nos conduz para certos caminhos. Não nos podemos afastar do mundo mesmo que a criação seja a certo momento um ato ‘individual’ e privado mesmo que colaborativo em certas circunstâncias. Não podemos fugir já que poderá resultar numa estagnação como ‘artistas’ e como ser humanos. Há sempre uma fase de pesquisa que pode continuar ao longo da criação, quer para um trabalho específico quer proliferando para outras situações futuras. A experimentação poderá ter dois significados que implicam a escrita e paralelamente tentativas exploratórias de situações que pessoalmente poderão ser novas; e ainda, aquando da colocação em prática/ concerto, há a experimentação de certas situações que nem foram escritas, mas que poderão funcionar de forma mais eficaz ou até direcionar-se para o resultado que se pretende. Associada a estes dois itens está a invenção que resulta das situações anteriores e que se relaciona com a imaginação que precisa constantemente de estímulos, nomeadamente pesquisa e experimentação.

· O que para si significa a transdisciplinaridade e qual é a importância da mesma no seu trabalho? ·

PSA: Podem coexistir, várias facetas artísticas interventivas, interagindo entre si, e caraterizando o resultado como interativo disciplinar no trabalho que desenvolvo. Num artigo escrito para a revista Glosas, explorei um conceito que define o que sou e o que desenvolvo – Transversal Multi Art, e que surgiu de um estudo das terminologias referentes a práticas artísticas interativas. Refiro, John Cage e A Arte da Performance, Mauricio Kagel e o Teatro Instrumental, e Karlheinz Stockhausen e Música Cénica.
Criações dos séculos XX-XXI, que não se definem com os termos teatral, musical, ópera, mas que se caraterizam pela convergência das disciplinas para uma unidade e coesão, defino-as como inseridas na prática transversal multi art. Esta prática visa a unidade e assenta num pensamento organizador, procura estimular a compreensão da totalidade, com a articulação de elementos que passam entre, além e através das várias disciplinas, sendo a sua atitude, empática e de abertura, não significando unicamente a sua colaboração, não implicando adicionar, mas organizar e coexistir. Assim, e para enquadrar a transversal multi art, é imprescindível retomar alguns conteúdos sobre as referidas individualidades e respetivas práticas, já que funcionam como linhas condutoras para uma perceção do fenómeno.
Cage, integrado na categoria da Música Experimental, considerado o impulso deste percurso da transversalidade, influenciado pelos movimentos artísticos interativos disciplinares de A Arte da Performance, nomeadamente o Futurismo, Dadaísmo/ Surrealismo e Happening, e pela experimentação prática nas instituições Black Mountain College e New School for Social Research, proporcionou meios de reflexão e criação de novos conceitos e modelos artísticos, não só com a valorização do ato criativo-compositor, da execução-intérprete, e da perceção-audiência, mas também com o desenvolvimento de atitudes provenientes de operações de chance e indeterminação. Contribuiu com conceitos/ práticas relativos(as) à confluência de linguagens, à importância funcional dos elementos materiais (cenário, adereço, figurino, maquilhagem, luz), aos parâmetros fundamentais (espaço, tempo, corpo) e à relevância singular e coordenada das atitudes do criador, performer (músico, ator, bailarino, etc.), encenador, coreógrafo, equipa técnica, e audiência. Kagel, integrado na categoria do Teatro Instrumental, designação utilizada em 1958, na Düsseldorf Gallery 22, por Heinz-Klaus Metzger ao referir-se a “Music Walk” (1958) de Cage, sendo aplicada por Kagel, com fundamentação teórica e definição, nos anos 60, influenciado pela Bauhaus de 1950 (Buenos Aires), fundiu o serialismo integral com técnicas aleatórias e eletrónica em tempo real, inspirado pelo Fluxus, questionando os limites não só da música e da composição, mas também da arte e do processo criativo. Apesar de ser considerado um artista multifacetado, assinalam-se linhas orientadoras, baseadas na composição como processo e não produto, referente ao exterior e relacionada com este, e não obstante estar atento à coesão estrutural e consciência estilística, considera a técnica composicional, o estilo, e o resultado criativo, meios de indagação intelectual, onde a música não é concebida como uma estrutura objetiva autónoma mas funcionando como comentário social e cultural. Contribuiu com conceitos/ práticas relativos(as) à reconstrução da totalidade da performance tradicional, à qualidade teatral na performance musical de natureza visual e cinética, à oscilação entre papéis (duplicidade) integrantes da performance instrumental, à inexistência da representação de um papel, tempo simbólico e narrativa, à referência a uma realidade fora de si através da metonímia e não da representação. Stockhausen, integrando-se na categoria da Música Cénica, designação utilizada pelo próprio para definir a sua pesquisa músico-teatral, realça a criação em várias dimensões (o som, o gesto, o texto, a imagem, o espaço, etc.) e sua conexão, submetendo-as a uma organização global específica, obedecendo aos princípios que regem a estruturação da matéria do som, à visão subjetiva do encenador e versão pessoal do espetador. Apela a todos os sentidos, propondo-se o desenvolvimento e aperfeiçoamento da sensibilidade e da capacidade de compreensão, sendo a faceta espiritual, nessas extensões percetivas, caraterizada pela pluralidade (sempre crescente) de significados. Esta interação evoca necessariamente a ideia de Gesamtkunstwerk, com a unificação entre a música, teatro, canto, dança e artes plásticas, numa síntese que culmina na obra de arte total, não se pretendendo, todavia, a inclusão da Música Cénica neste conceito estético, já que implica conotações históricas desde o final do século XIX, podendo, todavia, ser considerado a pré-história das suas diretrizes criativas. Contribuiu com conceitos/ práticas relativos(as) à composição com fórmulas (Formelkomposition), à inexistência de narratividade, à desierarquização entre música-texto, ao relacionamento entre o sonoro e o visual, à obrigatoriedade de pesquisa dos músicos/ como ‘atores’, à adaptação ao espaço com indicações específicas e precisas da mise-en-scène.
Após esta abordagem, que incidiu sobre as três práticas, que se manifestam como interativas disciplinares, encaminha-se este percurso para a prática denominada por transversal multi art, que implica igualmente a criação com moldes interativos disciplinares, onde todas as vertentes são ‘exploradas’ simultaneamente, num mesmo nível/ plano de linhas paralelas, recorrendo-se à informação/ conteúdo de cada uma, existindo um estudo/ pesquisa para culminar num resultado transversal, sendo esta transversalidade criadora de vários ângulos interpretativos.

· Se não tivesse seguido o caminho de compositora quais poderiam ser os caminhos alternativos? ·

PSA: Contrariando um pouco a questão, o meu caminho não é de compositora, mas sim de um ser do mundo que tenta de alguma forma manter viva uma faceta que não tem explicação objetiva, sendo necessário e até enriquecedor ter outras funções em paralelo, nomeadamente de docente, mas também interligando outras áreas quer na sua prática como ‘compositora’ quer em colaboração criativa em áreas relativas à imagem e texto neste momento. Há implicações em ter várias funções em simultâneo, nomeadamente a falta de tempo por vezes ‘mental’ para concretizar os projetos que implicam a criação. A melhor forma de encarar esta situação é pensar que todas as experiências são enriquecedoras e nos fazem ‘evoluir’, quaisquer que elas sejam. É quase impossível de encarar uma vida só dedicada à ‘composição’ já que não há uma estrutura sólida para que se consiga sobreviver, faltando encomendas regulares, organização de concertos e festivais como forma de divulgação e partilha. Neste sentido, o caminho a seguir tem que contornar esta situação, e requer a nossa adaptação e aceitação.

· Qual a importância do espaço e do timbre na sua música? ·

PSA: Como referi anteriormente, as práticas inseridas na transversal multi art implicam ter em conta os vários elementos onde se inclui o espaço e o estudo deste, e o timbre resultante/ o som resultante/ a sua proveniência. Quando se propõe um projeto criativo, penso imediatamente em todos estes elementos e como podem estar unidos já que, mesmo que seja puramente instrumental poderemos ter anotações específicas nas notas de performance sobre vários elementos que achamos essenciais para além do discurso musical. Está sempre subjacente um pensamento organizador, com a articulação de elementos que coexistem no tempo e no espaço.

· Quais as obras que pode considerar como pontos de viragem no seu percurso enquanto compositora? ·

PSA: Ao referir as criações que considero significantes, estão implícitos vários fatores que as tornaram como tal e não unicamente pelo resultado em si: as fontes de impulso inspirador, a instrumentação, o grupo/ solista que a estreou, para quem foi escrita e em que circunstâncias, a experiência que proporcionou a sua escrita, o envolvimento com os intervenientes e a apresentação em público.
Indico a orquestração/ composição experimentada diretamente com orquestra, de trabalhos originalmente escritos para grupo de câmara durante os I, II, III e IV Workshops da Gulbenkian para jovens Compositores Portugueses (Lisboa), com a orientação e direção de Guillaume Bourgogne; a experiência com o Ensemble Studio New Music de Moscovo, dirigido por Igor Dronov, que apresentou “Solitudo” (1998-1999) para flauta, clarinete, viola, violoncelo e piano), selecionada para o concurso International Gaudeamus Music Week 2001 (Amesterdão), sendo por um lado uma das primeiras experiências fora do país; o estudo em Inglaterra e o começo de uma nova fase composicional com compositores ingleses e o belga Luc Brewaeys; a composição do primeiro quarteto de cordas “Dulce Delirium” (2005) para o Arditti Quartet, no âmbito do workshop do Centre Acanthes (Metz, 2005), posteriormente apresentado pelo mesmo no Atlantic Waves Festival (Londres, 2006), no Auditório da Reitoria da Universidade de Aveiro e no Centro Cultural de Belém no âmbito do Festival Internacional de Aveiro (2007); a composição do segundo quarteto “Nocturna Itinera” (2008) também para o Arditti Quartet, integrada nos Cursos Internacionais para a Nova Música em Darmstadt (2008), permitindo a experimentação e composição diária em ensaios intensivos no 2.º Workshop Blonay de Música Contemporânea para Quarteto (2008); a composição das 5 peças para piano até ao presente ano, “Fatum Hominis” (2003-2004) para piano e dois atores, “In Occulto” (2009) para piano e ator e “Reditus ad vitam” (2013) para piano, ator, bailarinos/ filme, apresentadas em concerto pelos pianistas Filip Fak no concurso Internacional para os ISCM World Music Days/ 23rd Music Biennale Zagreb 2005, e Ian Pace no Ny Musikk (Oslo, 2005), no York Late Music Festival (2006), no Ciclo de Concertos Momentum (2009), no New Music Festival – Transit (2009) e na Temporada da City University of London (2010); “Vacuum Corporis” (2016) para piano e filme, no Transit Festival, Leuven (2017), Bélgica; “Desperatio” (2017-2018) para piano e filme na City University of London (2018) e SPAutores, Lisboa (2019); a experimentação da composição de uma miniatura para posterior junção numa obra coletiva de 25 compositores Portugueses, “Sublime Volans” (2010) para flauta, clarinete, violino, violoncelo e piano) no âmbito do 25.º aniversário da Miso Music Portugal e apresentada em concerto pelo Sond’Ar-te Electric Ensemble (Lisboa, 2010), no Fórum Internacional para Jovens Compositores (Lisboa, 2011), na Korea Foundation (Seul, 2011) e na Capital Europeia da Cultura 2012 (Guimarães), pelo Musica QuLacoza (Nagoya, 2020); a composição e revisão das anotações relativas à performance/ filme de “Tempus Fugit” (2020) para grupo de câmara, fotografia e filme, com a estreia pelo McGill Ensemble (Montreal, 2015) dirigido por Guillaume Bourgogne; a composição de “Instabile Tempus” (2016) para flauta, clarinete, violino, violoncelo e piano, vozes e cenário, e as várias apresentações que possibilitaram uma revisão a nível de cenário, mas também um amadurecimento ao longo das várias apresentações, a nível da performance, apresentada em concerto pelo Sond’Ar-te Electric Ensemble (Lisboa, 2016 e 2021 em Coimbra e Caldas da Rainha); a composição para um espaço específico e desafiador, de “Imaginis umbra est” (2019) para guitarra(s) e voz(es), que se baseou na temática “Em Louvor da Água”, e teve como proposta a escrita para guitarra solo, tendo-se posteriormente desdobrado e incluído dois intervenientes, e cujas funções se confundem, explorando-se não só as suas várias facetas como executantes multifuncionais (instrumento, voz, corpo, ação), mas também as características acústicas e arquitetónicas do espaço da Mãe D’Água das Amoreiras. O resultado pretendido é a fórmula ambiciosa de ‘obra total’, não só pela interação que surge com o espaço e suas caraterísticas, mas também com o público e com a exploração até ao limite quanto ao papel do(s) executante(s), isto é, o guitarrista transforma-se num executante multifuncional não só ao nível da execução tradicional do seu instrumento, mas também com a exploração das técnicas estendidas (mencionando-se os sons percussivos com uma gama escolhida pelo próprio de acordo com indicações prévias), da utilização da voz, com palavras/ frases e com ‘sonoridades’ específicas estabelecidas (respiração, soluço, grito, e outras), do corpo, com a movimentação no quadrado central, ponte lateral e zona circundante entre o público, tendo a colaboração do cantor que funciona como seu prolongamento, um ‘duplo’, fundindo-se mutuamente, e que utiliza igualmente uma guitarra, a voz e o corpo. Quanto à ‘história’, esta funciona como elemento estrutural do discurso total, dividindo-o em várias secções intimamente relacionadas conjuntamente com a movimentação no espaço, e as suas personagens (“Eco e Narciso”) são representadas pelos dois executantes, mas sempre em intercâmbio, podendo ser analisadas como uma única, em que uma é a duplicação da outra, isto é, em termos auditivos, Eco é o exemplo da ‘repetição’ do som, e Narciso, o reflexo/ ‘repetição’ da imagem na água.
Para além dos elementos referidos anteriormente – as fontes de impulso inspirador, a instrumentação, o grupo/ solista que a estreou, para quem foi escrita e em que circunstâncias, a experiência que proporcionou a sua escrita, o envolvimento com os intervenientes e a apresentação em público – considero que ultimamente a pesquisa em termos musicais, e que implica o estudo de obras de outros compositores e a utilização a diferentes níveis – estrutural, melódico, rítmico, ou outros, aliados a um discurso pessoal de ‘desguised quotations’ (‘to modify the manner or appearance of a reference or allusion’) como refiro na introdução destes trabalhos, tem sido a direção explorada. Incluo neste grupo peças como “Ludi Aeterni” (2022) para flauta, piano, cenário, performance e vídeo, sendo selecionadas partes de peças de Bela Bartók e John Cage e de forma retalhada e ‘reorquestrada’ integraram-se num discurso pessoal funcionando como pilares de uma construção musico-teatral com uma componente cíclica (comum ao processo composicional das peças já escritas) que se relaciona com a repetibilidade das vivências do ser humano e dos ‘jogos’ infantis que se reproduzem e evoluem de dia para dia, aparecendo quase impercetivelmente na paisagem/ discurso com o vento assobiado e ruídos das cordas do baloiço a chiar quando se aciona, para a frente e para trás num parque infantil; a peça para piano que está a ser escrita, com provável proliferação para outros trabalhos, “augurium#1”, e que surgiu da pesquisa da obra de Olivier Messiaen, estando integrada num projeto intitulado Trio de Damas que visa homenagear três pianistas portuguesas de suma relevância no panorama cultural do séc. XX: Helena Sá e Costa, Nella Maíssa, Olga Prats e que será integrada num programa a apresentar pela pianista Taíssa Poliakova Cunha. Vários são elementos que funcionam como fontes de impulso inspirador e que são sonoramente explorados – paisagem (íngreme, esculpida com picos e blocos de pedra), o voo dos pássaros (rápido e leve), o canto dos pássaros (nas suas variantes), o grito trágico (agressivo) e o canto do anjo (etéreo), construindo-se uma paisagem de onde surge um canto e um grito tal como o canto dos pássaros com uma organização formal dividida por sete secções com o ponto de chegada climática na quinta secção, com o voo dos pássaros rápido e leve e o grito trágico agressivo que se repete e desenvolve em relação ao seu aparecimento na segunda secção.

· Como escuta a música? É um processo mais racional (analítico) ou emocional? ·

PSA: Escutar/ Ver no seu conjunto e perante as diversos estilos e tipificação do trabalho apresentado é também ele um processo que envolve uma postura emocional e analítica e possivelmente diferente de alguém sem um background musical/ artístico. Juntam-se os dois processos já que é impossível ‘fugir’ da análise que está inerente ao pensamento/ emoção. O hábito analítico da música ao longo do tempo, nem que seja pela necessidade de pesquisa e de informação para partilhar com os alunos ou para proveito próprio de enriquecimento ou desenvolvimento do trabalho criativo é o ‘preço a pagar’ para quem tem um background musical/ artístico, sentindo por vezes a necessidade de usufruir sem qualquer explicação.

· Na Entrevista dada ao MIC.PT em 2016 o compositor João Madureira disse que «a música é filosofia, é política, e que, por sua vez, é uma forma de habitar o mundo» 1. Sente proximidade com esta afirmação? Em que medida a música pode transformar o nosso tempo? ·

PSA: É uma forma de habitar o mundo e de sobrevivência para aqueles que têm a necessidade de conjugar a sua vivência/ existência com a sua maneira de ser/ criativo, transmitindo o resultado através da música e/ ou outras áreas. Neste caso é um meio que permite perpetuar um discurso pessoal, que se transforma ao longo da vida, e que transmite ou não o que se sente num momento específico, e que cada um pode ter afinidade quando ouve/ vê, sendo uma experiência racional/ emocional em simultâneo.

· Prefere trabalhar isolada na ‘tranquilidade do campo’ ou no meio do ‘alvoroço urbano’? ·

PSA: Depende em que fase me encontro no trabalho de composição. Depende do dia. Quase todos os dias há uma mudança de atitude conforme o que a vida nos pede. Há que haver uma adaptação constante de dia para dia. O silêncio interior é mais importante que o exterior. Mas também preciso de silêncio no espaço. Mas também (repetição propositada) consigo trabalhar no alvoroço. Assim, não consigo definir. Na primeira fase, a ‘comunicação’ com o exterior e a pesquisa é fundamental, e neste sentido, o ‘alvoroço’ interior é permanente, independentemente do exterior. A segunda fase já requer mais definição e decisão, e por isso uma tranquilidade interior e exterior que se prolonga para a terceira fase que sendo o momento da escrita, é um caminho longo que se finaliza na quarta fase, com a revisão e finalização. Resumindo, cada fase tem a sua particularidade que permite ser mais ou menos tranquila sendo importante definir o ‘espaço’ interior e exterior neste processo.

· Tente avaliar a situação atual da música portuguesa, referindo a situação de compositores e apontando as suas preocupações principais. ·

PSA: Para avaliar a situação atual tenho que referir, novamente, como aconteceu numa entrevista anterior, que é bastante irregular nos seus vários níveis, tendo que haver uma reflexão sobre vários aspetos: Ensino, Sistema, Meios.
ENSINO Quando referimos qualquer situação artística é essencial analisar o ensino desta e os profissionais envolvidos e público, e que irão definir as situações atuais e futuras. O número de alunos que seguem o ensino secundário da música continua a ser reduzido, não só porque é uma área que não permite a sustentabilidade só por si, mas também espelha a influência dos próprios familiares aquando das decisões de ‘vida’ dos filhos. Assim, há uma preocupação constante para além do referido, de dar a conhecer o mais possível, durante o percurso destes alunos, o panorama musical dos séculos XX-XXI, não só em aula, mas também através da organização de momentos com intervenientes externos, pretendendo-se o desenvolvimento humano/ artístico, sempre paralelo ao espírito crítico. É nosso dever, descobrir, incentivar e guiar as diferentes potencialidades dos alunos, encaminhando-os para um possível campo artístico. É necessária a remodelação das aprendizagens, indo ao encontro de novos ideais de acordo com a atualidade.
SISTEMA (concertos) Definitivamente as possibilidades de mudança têm sempre a contrarreação como sobrecarga para quem pretende colocar em prática projetos de caráter ‘inovador’, não convencional. É uma tremenda batalha de resistência/ persistência. Ainda permanece a dificuldade em organizar concertos com uma programação dedicada aos séculos XX-XXI, tornando-se mais difícil quando esta se baseia em projetos interativos disciplinares, necessitando não só de instrumentistas, mas também de outras condições para a sua apresentação. A difícil aceitação por parte do público, que ainda não está suficientemente ‘educado’ para aderir a este tipo de projetos, influencia as ‘apostas’, que continuam no repertório pré-século XX, que logo à partida tem audiência e apoios necessários para colmatar as exigências a todos os níveis, sem ter gastos, mas lucro.
(festivais e encomendas)
No que respeita aos festivais é necessária a sua organização para se proporcionar um intercâmbio contínuo de conhecimento e experiência não só para os criadores mas também para o público em geral, tal como a organização de eventos com novas obras encomendadas. Sem festivais ou encomendas que proporcionem alguma estabilidade (ao criador) no período de composição e apresentação, estes continuarão a escrever quando têm tempo (já que necessitam de ter um emprego para sobreviver) ou por necessidade criativa. É claro que não podemos comparar a nossa realidade com outras, mas é clara a existência de Festivais de Música Contemporânea noutros países e quando são internacionais é imprescindível, e conforme as possibilidades, a participação como compositor, músico ou simplesmente como ouvinte permitindo o contacto com outras realidades artísticas e trabalhar com outros profissionais. Só assim, e não permanecendo uma ‘ilha’ conseguimos fazer as nossas escolhas e prosseguir um caminho que, no entanto, poderá ter sempre desvios.
MEIOS – HUMANOS No que respeita aos meios humanos, há uma necessidade urgente de valorizar os indivíduos (criadores) das gerações que agora se sentem capazes de partilhar e formar ‘escolas’ em Portugal, tendo em vista a solidificação não só de conhecimento, mas também de sensibilidades.
Refiro por exemplo, a situação dos bolseiros, e que pessoalmente me afetou, com projetos de investigação, e que não sentem qualquer incentivo para se dedicarem ao seu país por várias razões. São ‘aliciados’ a ensinar durante o percurso do seu projeto de investigação, tendo em vista um futuro posto de trabalho, retirando-lhes tempo para a investigação individual e sem segurança profissional aquando do final desta investigação.
Sentem-se também ‘espaços’ vazios de conhecimento que necessitam de ser preenchidos e que poderiam ser ocupados por pessoas altamente qualificadas se lhes abrissem as portas, tendo em vista a formação e criação de correntes de conhecimento e artísticas. Estes ‘espaços’, e sem negligenciar os séculos anteriores, deveriam abarcar conteúdos direcionados para a contemporaneidade quer a nível instrumental, teórico e de composição.

· Quais são os seus projetos decorrentes e futuros? ·

PSA: Dividem-se entre o ensino da composição e escrita. No ensino, têm envolvido uma reformulação do ensino da disciplina de Análise e Técnicas de Composição, com a remodelação das aprendizagens essenciais, incluindo várias vertentes nomeadamente a Análise, as Técnicas, a Criação Livre, a Orquestração, e o Projeto Paralelo (invenção própria) que inclui duas partes, a Oficina Experimental Contemporânea e a Inteir’arte. Tem sido um percurso complicado, implicando a mudança total e a sua aplicação, todavia desafiador. Consegue-se seguir o percurso do aluno e a sua evolução e de ano para ano é essencial a adaptação de situações que não funcionaram ou ainda a introdução de novas ideias. Na criação, continuo com o percurso interativo disciplinar, apesar de poderem surgir projetos só instrumentais, baseando-se na investigação realizada no Pós-Doutoramento, que insistiu no estudo analítico de temas já referidos e a elaboração e aplicação de novos conceitos em modelos composicionais, tendo como conceito base a união entre as diversas áreas artísticas e a música. Está em curso a elaboração/ revisão da peça “Ludi Aeterni” no que respeita ao vídeo que irá ser integrado no final da peça, tal como a criação de um teaser a ser projetado fora da sala do concerto; a continuação da escrita de uma peça para piano solo, “augurium #1”, influenciada pela obra de Olivier Messiaen, que provavelmente irá ser incluída num ciclo de peças com a integração futura de vídeo ou fotografia; a escrita de duas peças para grupos de câmara com diferentes conjugações instrumentais e que implicam também a pesquisa e influência de compositores ainda a selecionar. Saliento ainda os projetos colaborativos com fotografia, filme e texto em exposições regulares no Coletivo Pescada Número 5 e que irão ainda decorrer durante 2022.

· Numa das entrevistas de 2020 o compositor Georg Friedrich Haas disse que «os criadores da nova arte agem como fermento na sociedade» 2. Qual é, na sua opinião, o papel que a música de arte desempenha na sociedade e como é possível aumentar a importância e o impacto deste papel? ·

PSA: Declaração. “O papel/ atividade do compositor como criador é tão importante como todos os outros papéis/ atividades a desempenhar no mundo. Não é tornar-se alguém socialmente ou intelectualmente e superiormente distinto, nem em relação aos outros seres humanos nem aos outros ‘géneros’ de composição, apesar de frequentemente se sentir como tal por simples vaidade ou pelo estatuto que lhe é atribuído por razões sociais/ históricas. Precisa de tornar-se reflexivo e estar atento ao panorama da música e das outras áreas artísticas, podendo conduzi-lo ao desenvolvimento de novos conceitos e modelos para futura aplicação nas suas criações, não significando isto que se insiste no constante destaque para o ‘único’ e novo, mas que o questionamento, a pesquisa e discussão estejam sempre subjacentes no ato criativo e na análise do nosso papel como seres humanos. Qualquer ato criativo envolve a dualidade estabilidade-mudança e o intercâmbio incessante entre estas duas realidades, permitindo a fluidez deste mesmo ato e a não-estagnação. Neste sentido, e com a caraterização detalhada anterior, a contribuição de um criador/ educador é formativa, criativa, cultural, humana, enriquecendo e fortalecendo, neste caso, a cultura e a educação em Portugal.” (Patrícia Sucena de Almeida, entrevista de dezembro de 2015, © MIC.PT)

Patrícia Sucena de Almeida, Junho-Agosto de 2022
© MIC.PT

1 Entrevista a João Madureira realizada pelo MIC.PT em 2016: LIGAÇÃO.
2 Entrevista a Georg Friedrich Haas conduzida por Filip Lech em Junho de 2020 e disponível on-line no portal Culture.pl: LIGAÇÃO.


Patrícia Sucena de Almeida · Playlist

   
Patrícia Sucena de Almeida · Na 1.ª Pessoa
Entrevista com Patrícia Sucena de Almeida conduzida por Pedro Boléo
gravação do O’culto da Ajuda em Lisboa (2019.10.28)
  Patrícia Sucena de Almeida · Ludi Aeterni (2022)
Duo Sond'Ar-te: Sílvia Cancela (flauta), Elsa Silva (piano)
Recital – Antena 2, O'culto da Ajuda em Lisboa, 30 de Maio de 2022
 
   
Patrícia Sucena de Almeida · Instabile Tempus (2016)
Sond'Ar-te Electric Ensemble sob a direção de Pedro Carneiro
No Feminino, O'culto da Ajuda em Lisboa, 15 de Setembro de 2021
  Patrícia Sucena de Almeida · Argumentum – Obniti Adversis (2001)
[excerto]
Remix Ensemble Casa da Música sob a direção de Sarah Ioannides
 
· Patrícia Sucena de Almeida · “Vacuum Corporis” (2016) · Ian Pace e Ben Smith (piano) · [gravação de autor] ·
· Patrícia Sucena de Almeida · “Sublime Volans” (2010) · Sond'Ar-te Electric Ensemble sob a direção de Pedro Neves · CADAVRES EXQUIS Portuguese Composers of the 21st Century [Miso Records (mcd 036.13)] ·
· Patrícia Sucena de Almeida · “In Occulto” (2009) · Ian Pace (piano) · MOMENTUM [Phonedition] ·
· Patrícia Sucena de Almeida · “Dulce Delirium” (2005) · Arditti Quartet · [gravação de autor] ·
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