Em foco

Música sem fronteiras. Portugal nas Jornadas Mundiais de Nova Música.


Imagem: mapa – membors da ISCM no mundo. Fonte: ISCM.

Índice
> Sociedade Internacional para Música Contemporânea – um olhar para a história.
> Portugal e a ISCM até 1998. Uma história com Jorge Peixinho no centro.
> Miso Music Portugal enquanto a Secção Portuguesa da ISCM (1999–).
> Música sem fronteiras.
> Compositores portugueses nas Jornadas Mundiais de Nova Música da ISCM, 1976–2025.
> Notas de rodapé


Sociedade Internacional para a Música Contemporânea – um olhar para a história.1

   A Sociedade Internacional para a Música Contemporânea (ISCM), a entidade que promove e coordena os festivais World New Music Days, foi criada em 1922 em Salzburgo na Áustria, depois do Internationale Kammermusikaufführungen, um festival de música contemporânea inserido no Festival Salzburgo e organizado por Rudolf Réti, com a assistência de Egon Wellesz, Paul Stefas e alguns jovens compositores vienenses. Esta ocasião contou com a presença de mais que 20 compositores, incluindo Anton Webern, Paul Hindemith, Bela Bartók, Zoltán Kodály, Arthur Honegger ou Darius Milhaud. Os participantes definiram este primeiro festival internacional de música depois da 1.ª Guerra Mundial, como o primeiro de uma série regular de eventos, no sentido de manter os compositores em contacto e apresentar ao público as novíssimas tendências musicais. No momento da sua fundação, a Sociedade determinou o seu propósito como um meio para quebrar barreiras nacionais e interesses pessoais, divulgando a música contemporânea «independentemente das tendências estéticas, da nacionalidade, raça, religião ou opiniões políticas» 2. A estes princípios e valores a Sociedade permanece fiel até hoje. Nos estatutos da ISCM 3, na versão aprovada pela Assembleia Geral em maio de 2018 durante o festival World New Music Days em Pequim na China, podemos ler: «Os valores da ISCM são: 1) diversidade artística na criação musical, sem preconceitos relativamente às diferenças de expressões musicais, estilos, géneros ou meios; nem em relação à raça, género, religião ou política; 2) procedimentos abertos e democráticos.» 4

Um pequeno parêntese: parece-nos que no mundo contemporâneo globalizado com as tendências nacionalistas a surgir e a ganhar força em todo o lado, é essencial enfatizarmos, revisitarmos e reavivarmos estes princípios, que, neste nosso percurso em prol da democracia e liberdade, estão a ficar esquecidos e desvalorizados. No início dos anos 90 do século passado Francis Fukuyama anunciou o fim da história. No seu livro de 1992, “The End of History and the Last Man”, este filósofo e economista argumenta que com a ascendência da democracia liberal que ocorreu depois da Guerra Fria e depois da dissolução da União Soviética, a humanidade, não só superou a passagem de um período particular na história do pós-guerra, como atingiu o fim da história propriamente dita, ou seja, o fim da evolução ideológica da humanidade e a universalização da democracia liberal ocidental como a forma definitiva de governação humana. 5 Hoje em dia, mais que 30 anos depois do manifesto de Fukuyama, podemos avaliar o quanto ele se enganou.

Voltando à história da ISCM, os festivais World New Music Days do período pré-Segunda Guerra Mundial destacaram-se como fóruns para os principais compositores desse tempo, proporcionando oportunidades para apresentações da música de compositores que moldaram a história da música do século XX – Paul Hindemith, Arnold Schoenberg ou Igor Stravinsky – e para estreias de novíssimas obras, tais como, “Cinco Peças” op. 10 de Anton Webern em 1923, “Concerto para Violino” de Alban Berg em 1936 ou “Das Augenlicht” op. 26 também de Webern (1938).

Apesar de ter sofrido várias perturbações durante a Segunda Guerra mundial a Sociedade Internacional para a Música Contemporânea sobreviveu à guerra, tendo voltado, depois, à sua plena atividade para desempenhar um papel importante na criação de ligações entre o Leste e o Oeste durante a Guerra Fria. Entre as estreias mais relevantes do período pós-guerra que decorreram nos festivais World New Music Days é preciso destacar “Le marteau sans maître” de Pierre Boulez em 1955 e “Kontakte” de Karlheinz Stockhausen em 1960.

O desenvolvimento de novos meios de produção e reprodução da música, assim como o crescimento da radiodifusão e o surgimento de novos ensembles e festivais dedicados à nova música (nomeadamente dos Internacionais Cursos de Verão em Darmstadt), de certa forma reduziram a importância e o ímpeto da ISCM. Não obstante, a partir dos anos 70 a Sociedade conseguiu retomar o seu prestígio anterior redefinindo o seu próprio caminho e tirando proveito da sua independência dos fatores políticos, do internacionalismo e da igualdade entre os seus grupos locais. Na década de 80 mais países da América Latina e da Ásia Oriental juntaram-se à ISCM e, depois do fim da União Soviética, vários países da Europa de Leste foram por ela acolhidos. Em 1988 o primeiro festival World New Music Days da Ásia Oriental decorreu em Hong Kong e em 1993 a Cidade do México recebeu o primeiro festival na América Latina. Para celebrar o centenário da ISCM, em 2023 o festival World New Music Days estreou-se no continente africano, tendo viajado até à África do Sul. E o ano 2025 será marcado pela organização do World New Music Days pela primeira vez em Portugal, que decorrerá entre os dias 30 de maio e 7 de junho em Lisboa e no Porto. É precisamente por esta ocasião que decidimos dar enfoque à história e à presença da música criada em Portugal nas Jornadas Mundiais de Nova Música da ISCM.


Portugal e a ISCM até 1998. Uma história com Jorge Peixinho no centro.

   De acordo com as informações do arquivo da ISCM, gentilmente disponibilizadas ao MIC.PT pelo vice-presidente da Sociedade, Frank J. Oteri 6, a primeira apresentação, oficialmente registada, de uma obra portuguesa no contexto dos festivais World New Music Days ocorreu em Boston nos Estados Unidos, já depois do 25 de Abril, em 1976. Neste festival, a mezzo-soprano Beverly Morgan e a New England Conservatory Symphony Orchestra, sob a direção de Gunther Schuller, interpretaram a obra “Voix” (1972) de Jorge Peixinho. Segundo Anton Haefeli, musicólogo e autor do livro de 1982 “IGNM, Die Internationale Gesellschaft für Neue Musik – Ihre Geschichte von 1922 bis zur Gegenwart” (“SIMC, Sociedade Internacional para a Música Contemporânea – a sua história desde 1922 até ao presente”), antes desta data existiu, entre 1946 e 1953, uma Secção Portuguesa da ISCM, mas que abandonou a rede em protesto pela ausência de música portuguesa no programa do World New Music Days 1952 em Salzburgo. Portugal voltou a juntar-se à Sociedade Internacional para Música Contemporânea em 1975, tendo sido a Secção Portuguesa da ISCM centrada em torno do compositor Jorge Peixinho. Não é certamente por acaso que este retorno de Portugal à ISCM aconteceu logo após a Revolução dos Cravos cujo vento de liberdade e mudança proporcionou ao país um novo início e uma abertura a um novo mundo.

Desde então, até 1995, nos festivais World New Music Days foram apresentadas 22 obras criadas em Portugal dos seguintes compositores e compositoras (por ordem alfabética): Alexandre Delgado (1965), Álvaro Salazar (1938), Amílcar Vasques-Dias (1945), Clotilde Rosa (1930–2017), Constança Capdeville (1937–1992), Emmanuel Nunes (1941–2012), Filipe de Sousa (1927–2006), João Rafael (1960), José Lopes e Silva (1937–2019), Jorge Peixinho (1940–1995) e Paulo Brandão (1950).

Por falta de dados historiográficos suficientes, em vários casos não é claro quais as obras que foram selecionadas para os festivais através das habituais Calls for Works e quais delas figuraram na programação dos festivais da ISCM por outras vias (por favor, consultem a listagem em baixo). É, no entanto, indubitável que neste período a presença regular da música criada em Portugal nas Jornadas Mundiais de Nova Música e a dinâmica nas relações entre Portugal e a ISCM deve-se, em grande parte, ao esforço de Jorge Peixinho, que em 1977 foi eleito membro do Conselho Executivo da ISCM 7. Neste período, destaca-se também a participação nas World New Music Days de alguns intérpretes portugueses, nomeadamente, do compositor e guitarrista José Lopes e Silva e do trompista e compositor Paulo Brandão que em 1978, nas World New Music Days em Helsínquia e Estocolmo, interpretaram a obra “Biálogo” para trompa, guitarra e eletrónica do próprio Paulo Brandão. Sete anos depois, em 1985 nos Países Baixos, os músicos do Grupo de Música Contemporânea de Lisboa estrearam-se nas Jornadas Mundiais de Nova Música participando num concerto quase inteiramente dedicado à música portuguesa.

Jorge Peixinho deixou-nos há 30 anos, a 30 de junho de 1995. Um dia antes da sua morte, no festival World New Music Days em Essen na Alemanha o ensemble norueguês Duo Cikada apresentou a obra “Intermezzo IVb” (1993) para dois pianos de Álvaro Salazar. No período entre a morte de Jorge Peixinho e 1999, ou seja, até à constituição da Miso Music Portugal enquanto a Secção Portuguesa da ISCM, de acordo com as informações proporcionadas por Frank J. Oteri, apenas duas obras peças portuguesas foram apresentadas no contexto das World New Music Days – a 22 de abril num recital na Escola de Música Chetham em Manchester, Inglaterra, o pianista Peter Lawson tocou “Pequena Obsessão Complusiva” (1995) de Alexandre Delgado e uma peça do ciclo “Siete Apuntes para um Meccano” (1995) de Álvaro Salazar 8.


Miso Music Portugal enquanto a Secção Portuguesa da ISCM (1999–).

   A convite do Conselho Executivo da ISCM, a Miso Music Portugal apresentou em 1998 a sua candidatura e foi formalmente aprovada pela Assembleia Geral da ISCM como a sua Secção Portuguesa, em 1999. Neste sentido, tal como as outras Secções da ISCM, a Miso Music Portugal passou a ter vários privilégios no seio da rede, incluindo o direito para participar nas Assembleias Gerais e votar, o direito para recomendar obras para os festivais World New Music Days através das Calls for Works anuais, assim como o direito para organizar em Portugal o festival World New Music Days.

A entrada da Miso Music Portugal na rede ISCM coincide com certos desenvolvimentos que no final dos anos 90 e no início dos anos 2000 decorreram dentro da própria associação. Foi um tempo em que a Miso Music assumiu a responsabilidade enquanto um dos agentes principais relativamente à internacionalização e à disseminação além-fronteiras da música contemporânea criada em Portugal. Neste sentido, a Miso Music não só criou afiliações com várias redes internacionais, entre as quais, além da ISCM, é preciso mencionar o Conselho Europeu e Internacional de Música (IMC–EMC), a Confederação Internacional de Música Eletroacústica (CIME–ICEM) e a Associação Internacional de Centros de Informação Musical (IAMIC), mas também desenvolveu a partir de 2001 e com lançamento em 2006, o Centro de Investigação e Informação da Música Portuguesa e o portal www.mic.pt.

Desde a sua afiliação com a ISCM em 1999, e até 2024, através das candidaturas que a Miso Music fez anualmente para as Calls for Works para as World New Music Days, no contexto destes festivais foram apresentadas 31 obras de 31 compositores portugueses (por ordem alfabética): André Castro (1983), Ângela da Ponte (1984), Ângela Lopes (1972), António Ferreira (1963), Bruno Gabirro (1973), Carlos Brito Dias (1993), Carlos Caires (1968), Cândido Lima (1939), César de Oliveira (1977), Clotilde Rosa (1930–2017), Daniel Davis (1990), Filipe Lopes (1981), Gonçalo Gato (1979), Hugo Ribeiro (1983), Hugo Vasco Reis (1981), Igor C. Silva (1989), Isabel Soveral (1961), João Castro Pinto (1977), João Madureira (1971), João Pedro Oliveira (1959), Luís Antunes Pena (1973), Luís Tinoco (1969), Miguel Azguime (1960), Patrícia Sucena de Almeida (1972), Paulo Bastos (1967), Paulo Ferreira-Lopes (1964), Pedro Amaral (1972), Pedro Rebelo (1972), Rui Penha (1981), Sara Carvalho (1970) e Vítor Rua (1961) (por favor, consultem a listagem em baixo).

De acordo com as regras estabelecidas nos estatutos da Sociedade Internacional para a Música Contemporânea, a Miso Music Portugal, enquanto a Secção Portuguesa da ISCM, pode propor, em resposta a cada uma das Call for Works, seis obras de compositores diferentes no âmbito de pelo menos quatro categorias da Call, garantindo assim a inclusão de pelo menos uma destas obras no programa do festival Wolrd New Music Days ao qual uma determinada Call diz respeito. Neste contexto, é preciso frisar o relevante número de 134 obras de compositores portugueses que a Miso Music Portugal candidatou para os festivais World New Music Days até agora.

Apesar de ser o anfitrião do World New Music Days 2025 em Portugal, também para este festival a Miso Music Portugal teve o direito de realizar a candidatura habitual em resposta à Call for Works. Neste sentido, a candidatura da Miso Music incluiu obras de Amílcar Vasques-Dias (1945), Ângela Lopes (1972), Christopher Bochmann (1950), Fátima Fonte (1983), Gonçalo Gato (1979) e Mariana Vieira (1997). A avaliação de todas as obras submetidas em resposta à Call for Works pelos membros da ISCM do mundo inteiro foi realizada por um júri internacional 9 constituído por 18 compositores e maestros e também pelos membros das instituições parceiras das World New Music Days 2025. Neste sentido, para o programa do festival foram selecionadas pelo júri internacional duas obras portuguesas: “Cartas Portuguesas” (2020) de Fátima Fonte na Categoria n.º 8 – Duos e “Elementos” (2018) de Gonçalo Gato na Categoria n.º 7 – Trio.

A história das relações entre Portugal e a Sociedade Internacional para a Música Contemporânea tem quase 80 anos (se incluirmos a Secção Portuguesa que terá existido entre 1946 e 1953). Em 2025, no ano em que a Miso Music Portugal celebra o seu 40.º aniversário, finalmente tornou-se possível a organização em Portugal das Jornadas Mundiais de Nova Música que certamente é um dos maiores e mais vibrantes festivais anuais de música erudita contemporânea. Este festival, a decorrer entre 30 de maio e 7 de junho em Lisboa e no Porto, marcará um momento de grande relevância para a música portuguesa da atualidade, apresentando a riqueza e a qualidade da música erudita contemporânea criada em Portugal, mostrando a altíssima competência de intérpretes portugueses e também dando a conhecer em Portugal o que se anda a fazer na música contemporânea pelo mundo fora. Adicionalmente, o festival assume o subtítulo “Sede de Mudança”, refletindo o tema da urgência e da transformação que se impõe ao nosso “planeta azul” face aos desafios ambientais e sociais da atualidade. A organização deste festival pela Miso Music Portugal e sob a chancela da ISCM, nunca teria sido possível sem o envolvimento indispensável de vários parceiros, a saber (por ordem alfabética): Camerata Alma Mater, Casa da Música, Centro Cultural de Belém, Concrète [Lab] Ensemble, Coro Infantil e Juvenil da Universidade de Lisboa, Culturgest, Fundação Calouste Gulbenkian, MAAT: Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, Mosteiro dos Jerónimos, MPMP Património Musical Vivo, Nova Era Vocal Ensemble, Orquestra Metropolitana de Lisboa, São Luiz Teatro Municipal, Sond’Ar-te Electric Ensemble e ainda maestros e solistas de exceção.


Música sem fronteiras.

   Na passagem entre os séculos XX e XXI, a decisão da Miso Music Portugal de se juntar à Sociedade Internacional para Música Contemporânea (e a várias outras redes internacionais ligadas à nova criação musical), foi uma resposta construtiva aos grandes desafios colocados a toda a comunidade musical pela globalização em constante aceleração. Foi também, certamente, um gesto relevante que contribuiu e contribui para a participação ativa de Portugal na comunidade internacional da música erudita contemporânea. No mundo globalizado a visibilidade e, de certa forma, a própria existência da música criada em vários sítios do mundo, depende das práticas ligadas à internacionalização. Como podemos definir este termo?

Na música erudita contemporânea a «internacionalização» refere-se ao processo no contexto do qual as práticas, performances e obras musicais transcendem as suas origens nacionais, envolvendo-se num contexto global. Esse fenómeno abrange a fusão de tradições, ideias e inovações musicais entre diferentes culturas, resultando num universo diverso e interligado. Entre os agentes que incentivam a internacionalização podemos certamente mencionar os avanços na tecnologia, a mobilidade global e as plataformas digitais de colaboração e organização de iniciativas (como festivais, concursos, etc.). É preciso referir que a internacionalização não se limita à globalização das tradições clássicas europeias, mas inclui um envolvimento mútuo entre influências locais e globais, permitindo que compositores e músicos não ocidentais influam o campo musical nos seus próprios termos, contribuindo assim para fracionar hierarquias tradicionais e narrativas eurocêntricas e dando novas perspetivas. Não obstante, este processo traz-nos tanto oportunidades como desafios, celebrando a inclusão e a mistura cultural, por um lado, mas por outro, levantando questões sobre a apropriação cultural, a autenticidade e a preservação de identidades locais. Apesar destas dificuldades, é, porém, consensual que na música erudita contemporânea a internacionalização fomenta um diálogo à escala global, incentivando uma reflexão sobre a complexidade do mundo moderno.

Esta definição da internacionalização vai certamente ao encontro dos valores que norteiam a atividade da ISCM desde a sua fundação. Tentando ir ainda mais longe, podemos arriscar e dizer que no mundo globalizado os termos como «nacional» ou «patriótico» tornam-se obsoletos sobretudo no que à música erudita contemporânea e, consequentemente, a vários outros ramos de atividade artística diz respeito. Isso, contudo, não significa que devemos desistir de cuidar do que é local – dos costumes, dos valores, das tradições e também das músicas. Antes pelo contrário. Nos tempos que correm, este cuidado é necessário para preservarmos a identidade dos territórios (por mais pequenos que sejam) onde vivemos e pelos quais somos responsáveis. O que se torna ultrapassado é o «nacional», «patriótico» ou «nosso» entendido à maneira do século XIX quando estas palavras ganham dimensões «universalistas» ou até religiosas.

Nos tempos que correm, quando o «nacional à maneira do século XIX» está a voltar com força, a organização de iniciativas como o festival World New Music Days torna-se ainda mais relevante no sentido de não deixarmos o pêndulo do tempo e da história oscilar novamente para o lado nacionalista. Sim, porque este pêndulo, ao contrário do que nos tentou ensinar Fukuyama no início dos anos 90 do século passado, está sempre em movimento. Nunca para.

Para todas as pessoas que querem ter a certeza de que não lançamos as palavras em vão, fica aqui o convite para o festival ISCM World New Music Days 2025 que promete ser uma celebração da inovação musical, do intercâmbio artístico e uma plataforma de reflexão sobre o papel transformador da música em tempos de mudança. Tal como acontece todos os anos desde a fundação da ISCM em 1922, também este festival juntará a comunidade global de música erudita contemporânea num dos territórios do planeta Terra – desta vez em Lisboa e no Porto – para criar um espaço privilegiado onde será possível experienciar na própria pele e ouvidos que, pela sua riqueza, diversidade, inovação e inquietação, a música erudita contemporânea realmente não tem fronteiras.

Jakub Szczypa · © MIC.PT
fevereiro de 2025

Agradecimentos.
A Frank J. Oteri, vice-presidente da Sociedade Internacional para a Música Contemporânea,
pela partilha dos dados do arquivo da ISCM relativos às apresetnações da música
de compositores portugueses nas Jornadas Mundiais de Nova Música.
A Miguel Azguime, pela revisão e correção da versão portuguesa do texto.


Compositores portugueses nas Jornadas Mundiais de Nova Música da ISCM, 1976–2025.

A cor azul indica as obras apresentadas nos festivais World New Music Days entre os anos 1976 e 1998, marcados pela atividade de Jorge Peixinho (1940–1995) no que à dinâmica das relaçãos entre Portugal e a ISCM diz respeito. Por sua vez, a cor laranja indica as obras apresentadas nas WNMD a partir de 1999, quando a Miso Music Portugal assumium o papel da Secção Portuguesa da ISCM.

1976 (Boston · EUA)
· Jorge Peixinho (1940–1995) · “Voix” (1972), mezzo-soprano e orquestra de câmara
na interpretação de Beverly Morgan (mezzo-soprano) e a New England Conservatory Symphony Orchestra sob a direção de Gunther Schuller

1978 (Helsínquia e Estocolmo · Finlândia e Suécia)
· Paulo Brandão (1950) · “Biálogo” (1976), trompa, guitarra e eletrónica
na interpretação de Paulo Brandão (trompa) e José Lopes e Silva (guitarra)

1979 (Atenas · Grécia)
· Clotilde Rosa (1930– 2017) · “Alternâncias” (1976), flauta e piano

1980 (Jerusalém · Israel)
· José Lópes e Silva (1937–2019) · “Epígono I” (1978), guitarra com amplificação

1981 (Bruxelas e Ghent · Bélgica)
· Filipe de Sousa (1927–2006) · “Cantico”, eletroacústica sobre suporte
· Jorge Peixinho (1940–1995) · “Warsaw Workshop Waltz” (1980), clarinete, trombone, violincelo e piano

1983 (Aarhus · Dinamarca)
· Amílcar Vasques-Dias (1945) · “Balada do amor militante” (1980), piano, contrabaixo e orquestra de metais
na interpretação da orquestra De Volharding

1985 (Amsterdão · Países Baixos)
· Álvaro Salazar (1938) · “Ludi Officinales” (1979), piano e percussão
na interpretação dos membros do GMCL
· Clotilde Rosa (1930–2017) · “Recondita Armonia” (1984), ensemble
na interrpetação do Grupo de Música Contemporânea de Lisboa
· Constança Capdeville (1937–1992) · “Avec Picasso, ce Matin…” (1984), piano e eletrónica
na interpretação de Jorge Peixinho
· Jorge Peixinho (1940–1995) · “Meta-Formoses” (1985), clarinete baixo solo, flauta, clarinete, trompete, harpa, guitarra, e cordas
na interrpetação de Harry Sparnaay (clarinete baixo) e do Grupo de Música Contemporânea de Lisboa
· José Lopes e Silva (1937–2019) · “Nocturnal I” (1984), guitarra preparada e percussão
na interpretação dos membros do GMCL: José Lopes e Silva (guitarra preparada), Catarina Latino (percussão) e Jorge Peixinho (direcção)
[este concerto com enfoque à música portuguesa teve lugar a 9 de outubro de 1985, no De IJsbreeker em Amsterdão]

1986 (Budapeste · Hungria)
· Paulo Brandão (1950) · “Estigma” (1983), guitarra
na interpretação de Zoltán Tokos (guitarra)

1987 (Colónia · Alemanha)
· Emmanuel Nunes (1941–2012) · “Wandlungen” (1986), 25 instrumentos e eletrónica
na interpretação do Ensemble Modern e Ernest Bour (maestro)

1989 (Amsterdão · Países Baixos)
· Paulo Brandão (1950) · “Aqueous Fire” (1988), clarinete e percussão
na interpretação de Piotr Szymyslik (clarinete) e Victor Oskam (percussão)

1990 (Oslo · Norquega)
· Jorge Peixinho (1940–1995) · “Oucam a soma dos sons que soam” (1986), flauta, clarinete, piano, percussão e cordas

1993 (Cidade do México · México)
· Alexandre Delgado (1965) · “Antagonia” (1990), violoncelo solo
na interpretação de Bożena Sławińska (violoncelo)
· Clotilde Rosa (1930–2017) · “Waving”(1992), piano
na interpretação de Michael Finnissy (piano)

1994 (Estocolomo · Suécia)
· João Rafael (1960) · “Occasus” (1991), ensemble instrumental
na interpretação do Ensemble Ma e Staffan Larson (direção)

1995 (Essen · Alemanha)
· Álvaro Salazar (1938) · “Intermezzo Ivb” (1993), dois pianos
na interpretação do Duo Cikada

1998 (Manchester · Inglaterra)
· Alexandre Delgado (1965) · “Pequena Obsessão Compulsiva” (1995), piano
· Álvaro Salazar (1938) · uma peça do ciclo “Siete Apuntes para un Meccano” (1995), piano
na interpretação de Peter Lawson (piano)

2001 (Yokohama · Japão)
· Miguel Azguime (1960) · “De l'Étant qui le Nie” (1998), piano e eletrónica
· Pedro Amaral (1972) · “Transmutations” (1999), piano e eletrónica

2002 (Hong Kong)
· Isabel Soveral (1961) · “Anamorphoses III” (1995), violino e eletrónica
na interpretação de Mari Kimura (violino)

2003 (Liubliana · Eslovénia)
· Luís Tinoco (1969) · “Canto para Timor Leste” (1998), 14 cordas solistas

2004 (Suíça)
· Cândido Lima (1939) · “Ñcàãncôa” (1995), clarinete e eletrónica
· Paulo Ferreira-Lopes (1964) · “noD1” (2004), música eletroacústica sobre suporte

2005 (Zagreb · Croácia)
· João Madureira (1971) · “Três Momentos para Ana Hatherly” (2003), dois sopranos, recitante e orquestra de câmara
na interpretação do Art Ensemble NRW
· Patrícia Sucena de Almeida (1972) · “Fatum Hominis” (2003–2004), piano e dois atores
· Vítor Rua (1961) · “Voci di una Città Immaginaria” (2004), saxofone alto e eletrónica
na interpretação de Goran Merčep (saxofone)

2006 (Estugarda · Alemanha)
· Luís Antunes Pena (1973) · “Anatomia de um Poema Sonoro” (2004), ensemble e eletrónica
na interpretação do Ensemble Mosaik Mafalda de Lemos (soprano), Fabian Sattler (recitante), Digital Masters (som), Enno Poppe (maestro)

2007 (Hong Kong e Macau)
· Miguel Azguime (1960) · “Derrière Son Double” (2001), ensemble e eletrónica
na interpretação da pianista Nancy Loo e da HK Kamerata com Lo Hau-man (maestro)

2009 (Visby, Växjö e Gotemburgo · Suécia)
· Bruno Gabirro (1973) · “Rebel (Chaos)” (2008), orquestra de cordas
na interpretação da Orquestra de Cordas Musica Vitae e Staffan Larson (maestro)
· César de Oliveira (1977) · “chiarezza lontana, respire affannoso” (2004), orquestra de cordas
na interpretação da Orquestra de Cordas Musica Vitae e Staffan Larson (maestro)
· Hugo Ribeiro (1983) · “Carta a Kundera” (2007), 14 instrumentos
na interpretação do ensemble Gageego! e Pierre-André Valade (maestro)

2010 (Sydney · Austrália)
· André Castro (1983) · “Radio Fragments” (2009), instalação

2011 (Zagreb · Croácia)
· Rui Penha (1981) · “ex nihilo” (2009), quarteto de percussão
na interpretação do ensemble biNg bang

2012 (Bruxelas, Leuven, Mons, Ghent, Bruges, Antuérpia · Bélgica)
· António Ferreira (1963) · “Les barricades mystérieuses” (2009), música eletroacústica sobre suporte

2013 (Košice, Bratislava, Viena · Áustria e Eslováquia)
· António de Sousa Dias (1959) · “Tonnetz09-B” (2010), instalação interactiva, audiovisual e multicanal
[nota: a obra de António de Sousa Dias foi selecionada para as Jornadas Mundiais de Nova Música 2013, mas a sua apresentação pública não se concretizou]
· Pedro Rebelo (1972) · “Trio” (2011), três instrumentos
na interpretação do Veni Ensemble/ Thrensemble

2014 (Wrocław · Polónia)
· Cândido Lima (1939) · “Momentos-Memorias II” (1984–2014), duas guitarras (portuguesa e clássica) e cordas
na interrpetação de Miguel Raposo (guitarra portuguesa), Philippe Raposo (guitarra clássica) e da Orquestra de Nova Música com Szymon Bywalec (maestro)
[nota: a obra de Cândido Lima foi apresentada no contexto de um concerto especial das Jornadas Mundiais de Nova Música 2014, organizado pelo Polish Music Information Centre (POLMIC) e intitulado “Tradição e Nova Música”; a inclusão desta obra no programa do concerto resultou de uma proposta feita pelo MIC.PT em resposta a ao Call lançado pelo POLMIC]

· Carlos Caires (1968) · “All-in-one” (2010), ensemble e eletrónica
na interrpetação da Orquestra de Nova Música e Szymon Bywalec (maestro)
· Miguel Azguime (1960) · “A Menina Gotinha de Água” (2011), ópera para crianças
[nota: a obra de Miguel Azguime foi selecionada para as Jornadas Mundiais de Nova Música 2014, mas a sua apresentação pública não se concretizou]

2015 (Liubliana · Eslovénia)
· Patrícia Sucena Almeida (1972) · “Nocturna Itinera” (2008), quarteto de cordas

2016 (Tongyeong · Coreia do Sul)
· Igor C. Silva (1989) · “Frames #87” (2011), clarinete, eletrónica e vídeo

2017 (Vancouver · Canadá)
· Gonçalo Gato (1979) · “A Walk in the Countryside” (2016), flauta solo
na interpretação de Mark Takeshi McGregor (flauta)

2019 (Tallinn, Tartu, Laulasmaa · Estónia)
· Clotilde Rosa (1930–2017) · “Peaceful Meeting” (2016), violoncelo e contrabaixo
na interpretação dos músicos do CoPeCo Collective: Teemu Mastovaara (violoncelo) e Kristin Kuldkepp (contrabaixo)
· Hugo Vasco Reis (1981) · “Metamorphosis and Resonances for harp solo” (2017), harpa solo
na interpretação de Liis Viira (harpa) do Ensemble Una Corda
· João Castro Pinto (1977) · “Obsidia – dos sons invisíveis ou das imagens audiveís” (2017), música eletrocústica sobre suporte

2022 (Auckland e Christchurch · Nova Zelândia)
· Daniel Davis (1990) · “Colours (here in)” (2018), coro misto
na interpretação do Coro de Câmara de Auckland e Jono Palmer (maestro)
· Paulo Bastos (1967) · “Íris-abandono…” (2016), vibrafone solo
na interpretação de Justin DeHart (vibrafone)
· Sara Carvalho (1970) · “sobre a areia o tempo poisa” (2016), violino, violoncelo e piano
na interpretação do NZTrio

2023 (Joanesburgo, Soweto e Cidade do Cabo · África do Sul)
· Ângela da Ponte (1984) · “We can’t breathe” (2021), flauta e eletrónica
na interpretação de Gergley Ittzés (flauta)

2024 (Tórshavn, Rituvík, Sandur, Gjógv, Fuglafjørður, Klaksvík, Øravík, Nólsoy · Ilhas Faroé)
· Carlos Brito Dias (1991) · “was birgst du so bang dein Gesicht?” (2019), orquestra de cordas
na interpretação da Lapland Chamber Orchestra
· Filipe Lopes (1981) · “clusia rosea” (2018), quarteto de cordas
na interpretação do quarteto de cordas do Caput Ensemble

2025 (Lisboa e Porto · Portugal)
· Fátima Fonte (1983) · “Cartas Portuguesas” (2020), voz e piano
na interpretação do Komorebi Duo com Camila Mandillo (sporano) e João Casimiro Almeida (piano)
· Gonçalo Gato (1979) · “Elementos” (2018), violino, violoncelo e piano
na interpretação do Sond’Ar-te Trio com Vítor Vieira (violino), Filipe Quaresma (violoncelo) e Elsa Silva (piano)


NOTAS DE RODAPÉ

1 A partir do artigo de Anton Haefeli, “International Society for Contemporary Music” (revisão: Reinhard Oehlschlägel). 2011, Grove Music Online (LIGAÇÃO).
2 Ibidem. Tradução para português: Jakub Szczypa.
3 Para consultar os estatutos da ISCM – International Society for Contemporary Music sigam esta LIGAÇÃO.
4 Ibidem. Tradução para português: Jakub Szczypa.
5 O livro “The End of History and the Last Man” de Francis Fukuyama (ed. Free Press, 1992, Nova Iorque, EUA) é uma expansão do seu artigo “The End of History?”, publicado no jornal de política internacional “The National Interest” no verão de 1989.
6 Os dados disponibilizados ao MIC.PT por Frank J. Oteri provêm do livro de Anton Haefeli, “IGNM, Die Internationale Gesellschaft für Neue Musik – Ihre Geschichte von 1922 bis zur Gegenwart” (ed. Atlantis Musikbuch-Verlag, 1982, Zurique, Suíça), do livro de Nicolas Slonimsky, “Music Since 1900” (ed. Schirmer Reference, 2001, Nova Iorque, EUA), dos programas antigos dos festivais ISCM World New Music Days e de outras fontes (jornais, relatórios nas edições passadas do ISCM World New Music Magazine, etc.).
7 De acordo com a biografia de Jorge Peixinho disponível no sítio da associação Arte no Tempo. Mais informações: LIGAÇÃO.
8 As peças de Alexandre Delgado e Álvaro Salazar fazem parte do “Album de Colien”, uma coleção de 38 miniaturas para piano encomendadas a compositores espanhóis e portugueses por Cecilia Colien Honegger, cada uma com aproximadamente um minuto e meio de duração. Álvaro Salazar compôs, na verdade, um total de sete miniaturas agrupadas em “Siete Apuntes para un Meccano” (1995), mas não temos certeza qual delas Peter Lawson interpretou em Manchester.
9 O júri que availou as obras submetidas em resposta ao Call for Works para o World New Music Days 2025 em Portugal foi constituído por: Adrian Moore (Reino Unido), Ângela da Ponte (Portugal), Doina Rotaru (Roménia), Flo Menezes (Brasil), Franz Martin Olbrisch (Alemanha), Gilles Gobeil (Canadá), Guillaume Bourgogne (França), John McLachlan (Irlanda), Lorraine Vaillancourt (Canadá), Masataka Matsuo (Japão), Michal Rataj (Chequia), Miguel Azguime (Portugal), Peter Swinnen (Bélgica), Petter Sundkvist (Suécia), Ramón Souto (Espanha), Rozalie Hirs (Países Baixos), Rui Penha (Portugal) e Valerio Sannicandro (Itália). Mais informações: LIGAÇÃO.

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