Compositor, investigador e Professor Associado na Universidade de Ciências Aplicadas de Mainz – Paulo Ferreira-Lopes está Em Foco no MIC.PT em maio, para assinalar seu 60.º aniversário.
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Categoria Musical Música Electroacústica sobre suporte
Instrumentação Sintética Electroacústica sobre Suporte
Meios Técnicos de Execução
CD, Sistema surround (5.1), 8, 4 e 2 canais
Estreia
Data 2002/Apr/02
Entidade/Evento Festival Música Viva 2002
Local Centro Cultural de Belém
Localidade Lisboa
País Portugal
Observações
Orquestra de Altifalantes (difusão sonora)
Notas Sobre a Obra
Ao compor Composição-I lembrei-me frequentemente de algumas tendências que a pintura tem assumido desde o início do século XX. O assumir da rugosidade das superfícies, provocando-a mesmo com a adição de materiais estranhos, o assumir de processos improvisatórios na execução do traço, e mesmo de processos aleatórios, como salpicar a tela com o pincel, ou deixar escorrer a tinta. Tal tendência é paralela na obra de vários compositores da música actual, mas a minha paixão pela pintura obriga-me a estabelecer um paralelo entre ambas as Artes.
Embora admire diversos pintores representativos deste tipo de atitude, lembrei-me talvez pela sua exuberância, ou por alguma identificação pessoal subjectiva, mais de Kandinsky e de Pollock. Sobretudo os quadros das fases de ambos em que à falta de outro termo chamaria de “mais abstractos” pelo facto de qualquer representação da realidade, e de símbolos da mesma, terem pouca ou nenhuma presença, ou poderem passar despercebidos, e pela ausência de alusão a qualquer objecto geométrico facilmente verbalizável. Com efeito a beleza que se destaca destas obras é para mim profunda e intensa apesar de (ou talvez por esse facto?) se observar facilmente que obedecem a critérios de estruturação e formalização bastante intuitivos, embora muitos deles identificáveis, e que a sua realização deve ter sido algo rápida como que uma improvisação. Termo aliás com que Kandinsky designou muitos dos seus quadros, e sendo em Pollock este processo um método de trabalho claramente assumido.
Tal lembrança surgiu de várias coincidências entre as duas formas de expressão. A primeira, o que chamaria da “rugosidade” ou “aspereza” ou mesmo “imperfeições do material” assumidas como resultado desejável na pintura final. Trata-se no fundo de tomar como resultado final sons que foram produzidos de maneira não convencional (principalmente sons de palheta de Oboé e Corne Inglês, ou das cordas da Viola atrás do cavalete). Tal rugosidade e aspereza são audíveis na complexidade tímbrica e harmónica de variados sons e acordes e também pela sua imprevisível evolução temporal.
A segunda no desenrolar formal global. Apesar de ter definido uma estrutura regular e rígida desde o início, para toda a distribuição instrumental harmónica e rítmica, o movimento composicional no interior da mesma (forma) obedeceu a critérios puramente intuitivos.
A terceira é que algum do material desta peça resultou de improvisações dos próprios músicos aquando da gravação.
O título Composição-I é uma citação de título que muitos pintores emprega(ra)m, nomeadamente os citados Kandinsky e Pollock, e simultaneamente é uma homenagem a essa grande arte que é a pintura.
Pedro Rocha