Entrevista a Fernando Corrêa de Oliveira / Interview with Fernando Corrêa de Oliveira
2004/Jan/21
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Estilo de Composição
O meu ponto de partida é suficientemente distinto dos outros para dizer
que me filio nesta ou naquela escola. Eu não me filio em nenhuma. Agora
o facto de não estar filiado numa escola não quer dizer que
não tenha tido um abrir de ideias provenientes de uma. Mas não
será a do Schoenberg. No meu há imensos temas que não
são sempre dodecafónicos, mas todos eles vieram também
do facto de eu conhecer o dodecafonismo. Eu também conheço o
dodecafonismo! Agora, o conhecer o dodecafonismo não quer dizer que
no dodecafonismo todos façam a mesma coisa. Todos fazem a mesma coisa
de maneiras diferentes!
Eu tenho duas fases. Tenho uma fase em que compunha livremente mas não
estava satisfeito com isso, porque ao compor livremente a pessoa acaba por
também compor como os outros. Então eu não compunha como
os outros, tinha os meus próprios temas. Para realmente ser diferente
é preciso ser diferente desde o princípio. Ora bem, a composição
tem que começar por uma coisa pequena. Essa coisa pequena é
um tema, e esse tema já tem que se lhe diga, porque um tema tem já
muita coisa. O tema é a ideia, e a ideia, embora pareça que
se está a querer complicar as coisas, tem que ser desenvolvida. Quando
eu escrevo uma sinfonia, essa sinfonia tem três temas ou quatro. Como
é que três temas ou quatro dão para meia-hora? Há
qualquer coisa mais: o desenvolvimento. Esse desenvolvimento existe, e no
tratado também digo como é que se desenvolve. Tudo isto são
notas, e ao escrever este livro estava também a experimentar coisas
e, à medida que as ia experimentando, ia rejeitando umas e aproveitando
outras. E porquê? Porque a composição é assim mesmo.
Nós não fazemos as coisas à primeira, fazemos e depois
dizemos: "há aqui qualquer coisa que não me agrada".
E aquela coisa que não me agrada tem que ser torneada. E então
para me agradar terá que ser assim e assado.
O que é importante não é o ser diferente, mas ser convincente. O que é preciso é ser convincente, mais do que ser diferente, porque entre os compositores que não eram diferentes e que eram convincentes nós temos, por exemplo, um Bach que é convincente, e no entanto ele fez aquelas coisas que os outros também faziam. O que é importante é ser-se convincente, dizer uma coisa e fazer com que essa coisa fique dentro da cabeça dos outros. O Schubert é um compositor que não fez praticamente nada de diferente. A música dele é sempre a mesma coisa, mas é sempre original, e está sempre a requisitar da nossa parte atenção. Ele chama a atenção, mas sem ser ostensivamente.
É mais fácil para
os alunos assimalar a Simetria Sonora do que o sistema dito clássico?
Ser fácil ou ser difícil depende de nós. Para mim é
fácil, para outros pode ser difícil. A verdade é que o
ser fácil ou ser difícil depende do compositor. Eu, quando comecei
a minha primeira obra, era muito fácil. Fui buscar justamente os elementos
fáceis para começar, mas a obra dura vinte minutos e eu não
estou vinte minutos sempre com a mesma coisa. É difícil estar
a dizer qual é o processo para começar. O processo para começar
será com poucas notas, não será necessariamente com doze,
mas podem ser mais. Pode haver uma pequena diferença, mas tem que haver
uma certa variedade.
A propósito de Schoenberg
Não quer dizer que este sistema de composição me obrigue a mim e a todos a traçar uma linha recta, porque, se assim fosse, as composições acabavam por ser todas iguais. Mas a diversidade também foi importante no meu sistema - eu rejeitei o sistema de Schoenberg precisamente porque o dele era assim. Tinha que ser assim. Ele tinha questões constantes com os seus alunos, porque cada um queria também fazer qualquer coisa à maneira dele e ele não queria deixar. Ele não queria deixar porque o sistema dele era rígido e então para ser aquilo que ele queria era preciso segui-lo. A minha primeira medida foi evitar que se caísse na monotonia. E tanto se pode cair na monotonia com uma coisa simples como com uma coisa complicada. O sistema dele, eu podia aqui explicá-lo em meia-hora. No fim de meia-hora eu teria explicado o sistema de Schoenberg, só que ninguém sabia depois fazer nada - porque para fazer qualquer coisa é preciso também ser compositor. Mas ele estabelecia várias regras muito simples, tão simples que qualquer pessoa podia aprendê-las, mas depois daí a fazer composição é um bocado diferente. Eu nisso não queria cair, porque queria, e parece-me que consegui, que cada um possa ser, à maneira dele e ao mesmo tempo à maneira do tratado. É preciso conceber um sistema elástico, que possa aumentar, diminuir, e satisfazer os diversos requisitos do compositor. O sistema de Schoenberg é muito simples, são doze notas seguidas, mas essas doze depois têm que sofrer umas transformações, e essas transformações não são fáceis.